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Da concordata à lei de recuperação judicial

Desde a lei 7661/1945 de concordatas e falências editada por Getúlio Vargas até a lei 14.112/2020, que atualizou e modernizou a lei 11.101/2005 de falências e recuperação judicial, passaram mais de 70 anos.

Tempo suficiente para que essas ferramentas jurídicas fossem aperfeiçoadas, objetivando a efetiva superação de crises de insolvência.

Realmente tivemos muitas evoluções, a começar pela eliminação do absurdo prazo de pagamentos aos credores, previstos na lei de 1945, de 40% da dívida até o final do primeiro ano após o pedido de concordata e 60% no segundo ano.

Já com a lei 11.101, em tese, foi permitida a livre negociação de prazos, juros e valores entre a recuperanda e seus credores.

Mas apenas em tese, pois a lei criou diversas categorias de credores, com privilégios e poderes que comprometem as possibilidades de superação da crise.

O exemplo mais gritante são as exceções do artigo 49, que excluem dos efeitos da RJ praticamente todas as dívidas financeiras, normalmente os maiores passivos das empresas em crise. São tantas as exceções que praticamente nenhuma instituição financeira se sujeita à RJ.

Ainda, mesmo que socialmente justa, os créditos trabalhistas deverão ser pagos em até 12 meses.  Mas é uma imposição que pode ser socialmente justa com os colaboradores demitidos e que será extremamente injusta com aqueles que continuam a trabalhar (maioria dos trabalhadores), se a falência for decretada.

Bem, sem me estender mais sobre a lei 11.101/2005, as estatísticas mostram que, apesar dos enormes avanços, os índices de RJs convertidos em falências superaram os 90%, desde o seu início. Portanto, a lei não se prestou ao seu principal objetivo, de preservação da atividade empresarial e dos empregos.

Com tantas regras e falhas na lei, a maioria das recuperações judiciais prosperou graças a artifícios utilizados visando superar as dificuldades criadas pela própria lei, assim como ocorria na antiga lei de 1945, quando quase nenhum credor pagava 40% no primeiro ano e 60% no segundo, e a concordata prosperava por décadas…

Sobre essa questão, há alguns anos publiquei um artigo com o título: A FALÊNCIA DA LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

Por fim, veio a última atualização com a lei 14.112/2020, que modernizou e legalizou algumas práticas, como por exemplo: o credor colaborativo, a possibilidade de Dip Financing, reduziu as exigências para a recuperação extrajudicial e ainda recebeu uma ajudinha do fisco com condições especiais para as empresas em RJ.

E o melhor da nova lei é que ela fechou as portas para as negociações paralelas, sem o conhecimento dos demais credores, uma prática que remonta aos anos de 1945.

Ainda que não tenha eliminado os vícios dos privilégios criados pela lei 11.101/05, a nova lei impõe regras para que as negociações sejam tratadas com transparência, ao exigir, por exemplo, que as cessões de crédito sejam noticiadas nos autos quando efetivados. Dessa forma todos os credores saberão em que condições um crédito foi negociado e se algum credor foi privilegiado.

Essa medida reprime as pressões de alguns credores contra as recuperandas e, principalmente, contra o seu caixa, uma das razões da maioria das falências.

Ainda que com muitas restrições, a nova lei de recuperação judicial deve reduzir substancialmente os índices de convolação em falência.

E agora, para se tornar uma lei do primeiro mundo, basta duas pequenas mudanças: A redução das classes de credores para duas: trabalhistas e demais credores, e a eliminação das exceções do artigo 49.

Com essas medidas certamente a relação 95% x 5% de falências x recuperações se inverterá em poucos anos.

 

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